segunda-feira, 11 de julho de 2005

Uma música da infância

Ele ficara o dia todo enfurnado em sua casa assistindo TV. Ao cair a noite foi para o banho e vários pensamentos invadiram sua mente. Pensava no futuro, nas possibilidades que um dia poderão tornar-se oportunidades. Pensava numa vida futura que não coincidia com a presente. Todas as oportunidades que criava mentalmente eram agarradas com toda sua abstração como uma opção de vida. Mas tudo estava longe. O momento era vazio. Não havia nada que o preenchia. Ao sair do banho deparou-se com o semblante de seu pai, que o olhava com piedade. Lembrou-se que morava sozinho e que não havia mais ninguém em sua casa. Aliás, a solidão era uma constante em sua vida. Percebeu que o olhar de seu pai era na verdade seu rosto refletido no espelho e viu o quanto estava mergulhado no passado e que todo aquele futuro idealizado era uma doce ilusão da sua própria dor.
Vestiu-se e pôs-se a perambular pelas ruas. Passou em frente de um bar e ouviu uma música que o fez lembrar de sua infância. Uma força desconhecida o atraiu para dentro. Entrou e assustou-se ao ver que todos no bar estavam nus. Havia quatro mesas redondas das quais duas estavam ocupadas. Na primeira havia um grupo de amigos bebendo e conversando. Na última mesa, quase na penumbra, avistou um casal que sussurrava palavras ao pé do ouvido um do outro. Provavelmente palavras de tom sexuais, pois o homem estava com seu membro semi-ereto. À esquerda, havia três bonitas mulheres no balcão, bebendo e rindo. O barman era um homem gordo com apenas uma gravata borboleta que o olhou com certo ar de interrogação. Outro aspecto que o chamou a atenção foram os quadros na parede. Eram fotografias de pessoas vestidas com roupas pretas mostrando apenas os olhos, parecido com algo que já avistara em outra ocasião que não lembrava exatamente onde. Ficou parado e não acreditava no que estava vendo. Sua incredubilidade foi interrompida por um garçom, também usando apenas uma gravata borboleta, mas com a significativa diferença de ser um homem belo e com formas definidas.
- O senhor poderia me acompanhar – interpelou o garçom com uma voz suave.
Com um olhar de quem acabara de acordar no presente, olhou para o garçom e consentiu sem pensar no que poderia lhe acontecer.
- Por aqui, por favor – insistiu o garçom mostrando-lhe um pequeno corredor à direita que desembocava em uma pequena sala repleta de cabides e algumas roupas dependuradas.
- Fique à vontade – exclamou o garçom, saindo logo em seguida e lhe dirigindo um sorriso malicioso.
Na verdade, não sabia se o sorriso acontecera realmente ou se era fruto de sua imaginação. Ficou por alguns segundos sem saber o que fazer e pensando nas três garotas do balcão. Lembrou-se das possibilidades que imaginou no banho e aquele momento transformou-se em oportunidades que lhe apresentava aos olhos do presente. Parou numa profunda angústia por alguns segundos. Estava estático e até esquecera o motivo que o fez entrar naquele lugar: a música que já não se ouvia mais.